quinta-feira, junho 23, 2005

Programação cultural, autarquias, associações...

A programação cultural, as artes em geral, não se justificam pela sua simples existência, necessitam da validação de um processo de comunicação efectivo, de emissor para receptor em que a mensagem deve ser tornada o mais legível possível, proporcionando qualidade à experiência. Não deve ficar pela auto-referencialidade guardada pelos seus devotos guardiães. Mas também não deve ceder à tentação de validar a sua qualidade pela afluência de público. Uma boa programação não tem necessariamente uma frequência alta. Os exemplos disso mesmo são mais do que muitos.
Verifica-se frequentemente, em particular nas autarquias, que o dinheiro gasto em pretensa programação cultural acaba por ser despesa com entretenimento (dos concertos pop-rock de artistas internacionais a brejeiros locais), com experiências efémeras que aquecem no momento mas não sedimentam. Acontece também que as poucas instituições culturais, fora dos grandes centros, colocam-se frequentemente num papel de intocáveis, porque são os únicos lá na terra e se não fossem eles era um “Ai Jesus!”. Não discutindo a importância do seu papel estruturante já discordo totalmente do unanimismo, muitas vezes reinante, em termos da programação que apresentam. Não é por serem os únicos e terem um papel importante, que estão justificados em termos da qualidade das vivências que proporcionam, devem ser questionados, pelos jornais, pelos interessados; deveriam sujeitar-se a uma discussão que lhes permitisse renovarem-se por dentro. Mas parece que nesta história, frequentemente, uns apanham boleia dos outros, acabando por se encontrarem à hora certa no mesmo local.

1 comentário:

Anónimo disse...

É com algum desencanto que partilho a tua visão. É de lamentar que a gestão cultural não seja entendida enquanto um aspecto especifico do enriquecimento popular dando lugar a uma gestão de raíz empresarial que apenas procura gerir a “situação”. Acrescento à tua reflecção o aspecto do clubismo político-ideológico que valida certas situações que, como bem dizes, são “experiências efémeras que aquecem no momento mas não sedimentam”. É precisamente esse “aquecimento” que vai permitindo que as peças vão ficando coladas num ambiente de paz podre no qual todos tossem para dentro diante de tantas oportunidades de reclamar. Mas pensemos assim: E se a autarquia “X” levasse a programação cultural a votos? Não seriam os brejeiros os mais votados? Não seria esse calor do momento, essa droga fácil, o mais apetecido? O que aqui pretendo dizer é que “uns apanham boleia dos outros” puxados por carros de bestas que ainda não foram suprimidos e que vão permitindo uma gestão cultural letárgica e vazia que pode ser levada a cabo pela besta mais atenta entre todas as bestas da zona. Não podemos analisar a carroça quando por detrás desta temos os bois que complicam toda uma engrenagem e legitimam o facilitismo cultural...Ou deveria dizer a nulidade? Necessitamos de massa crítica, e de vencer o medo de conhecer, porém esse medo só será ultrapassado com boas estratégias de desenvolvimento cognitivo a nível local. Não podemos levar uma exposição do Pedro Caldeira Cabral a uma vila que acabou de ver o Emanuel a tocar sem a ter devidamente preparada. Por que não uma iniciativa para trazer o interior à cidade, para levar pessoas sem infraestruturas culturais aos importantes (e por sinal vazios!!!) museus da metrópole? Se isto não se fez até à data será que podemos falar de uma metrópole?

Não é por serem os únicos e terem um papel importante, que estão justificados em termos da qualidade das vivências que proporcionam, devem ser questionados, pelos jornais, pelos interessados; deveriam sujeitar-se a uma discussão que lhes permitisse renovarem-se por dentro. Mas parece que nesta história, frequentemente, “uns apanham boleia dos outros”, acabando por se encontrarem à hora certa no mesmo local.