sexta-feira, agosto 05, 2005

“Cultura sim, mas nem tanto”

O sugestivo título utilizado numa das edições do jornal dos alunos da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa é um bom mote para algumas questões. A começar pelo facto de que sem infra-estruturas elementares, desde a rede de saneamento básico à água ao domicílio (de boa qualidade) passando por áreas de lazer como os jardins, a cultura não é uma prioridade. As terras onde estas infra-estruturas elementares são inexistentes ainda são demasiadas.
Talvez esta seja uma péssima altura para falar disto, porque é sabido que em tempo de crise (embora esta não afecte todos de igual modo) é usual cortar nos orçamentos da cultura. Até aqui tudo bem se o objectivo fosse dirigir o investimento para áreas prioritárias como as já referidas. Porém, a ideia com que se fica é que o grosso do investimento é feito faustosamente, para encher a vista e esconder debaixo do tapete o mais incómodo, sobretudo quando se aproximam eleições.
Pude já verificar que gestões de juntas de freguesia que não são da cor partidária do respectivo município são boicotadas em termos de verbas e equipamentos, quando finalmente sobe ao poder uma da mesma cor, aí sim, é ver as obras a avançar em todas as direcções, como quem diz “Estás a ver, estes fazem!”.
A maior parte dos municípios já possuiu um auditório, uma biblioteca com uma sala de exposições e outros equipamentos (alguns até centros culturais) onde apresentam o quê? Imagino a conversa…
- “Agora é que vai ser. Não somos menos do que os outros.
- Mas quem é que vem para cá animar isto?
- Isso logo se vê, podem ser uns gajos de Lisboa...”
Talvez pudessem fazer mais um “festival de música do mundo”, o nome é sonante e o mundo fica lá tão longe… Alguns eventos que utilizam estas designações apresentam uma espécie de fundo de catálogo de editoras, que são tudo menos propostas de conhecimento de outras culturas. São híbridos, que simulam a sua própria cultura.
Apetece recordar a expressão “o particular é universal”.
Não cabe ao Estado definir o que é cultura mas antes apoiar os agentes locais, nacionais, internacionais para esta se realize. Devíamos ter percorrido o caminho inverso ao que foi seguido, ou seja, primeiro desenvolver a qualidade de vida (salários, planeamento urbanístico, emprego, etc.), a partir daqui de certeza que surgiriam mais agentes activos capazes de construir o seu próprio discurso a partir da mundividência.

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